81Bildad de Chua8,1 Ver nota a 2,11. replicou:
2«Até quando vais falar dessa maneira?
As tuas palavras são como um vendaval!
3Será que o Deus todo-poderoso distorce a justiça
e não reconhece quem é inocente?
4Os teus filhos devem ter cometido faltas contra Deus
e ele fê-los pagar as consequências do seu pecado.
5Mas se tu te levantas de manhã cedo,
para pedires perdão ao Deus todo-poderoso,
6se fores honesto e justo,
ele decerto cuidará de ti8,6 Ou: ele há de dar-te mais filhos.
e te compensará da maneira que mereces.
7O teu passado terá pouca importância,
comparado com o futuro maravilhoso que te espera.
8Vai perguntar às gerações passadas
e reflete no ensino dos seus antepassados.
9Nós só nascemos ontem e nada sabemos ainda;
a nossa vida é uma pequena sombra sobre a terra.
10Mas eles hão de instruir-te e ensinar-te
as verdades tiradas da sua experiência.
11Será que o papiro8,11 Papiros. Plantas aquáticas com as quais se faziam embarcações e materiais destinados à escrita. pode crescer fora do pântano
ou o junco onde não houver água?
12Secaria mais depressa que outras plantas,
mesmo antes de estar criado e arrancado.
13Pois esse é o destino dos que se esquecem de Deus,
assim acabam as esperanças de quem é infiel.
14Aquilo em que confia não passa dum fio quebradiço
põe a sua esperança numa teia de aranha.
15Se se encosta à sua casa, ela não resiste,
se se agarra a ela não se aguenta de pé.
16São como árvore verdejante, que resiste ao sol
e espalha os seus ramos sobre o quintal.
17As suas raízes estendem-se por entre as pedras
e agarram-se aos muros da casa.
18Mas se a arrancam do seu lugar,
este há de renegá-la, dizendo: “Nunca te vi”.
19Assim termina a sua alegre vida
e da terra nasce outra árvore diferente.
20Mas Deus não rejeita aquele que é honesto
nem prende a mão dos que fazem o mal.
21Deus pode ainda encher-te de alegria
e fazer com que possas dar gritos de contentamento.
22Os que te querem mal ficarão cobertos de vergonha
e a morada desses malvados desaparecerá.»
91Job replicou:
2«É verdade! Eu sei que é assim,
que um homem não pode ter razão contra Deus9,2 Comparar com 4,17..
3Mesmo que se queira discutir com ele,
quem lhe pode responder a uma questão entre mil9,3 Ou: ninguém consegue responder-lhe a uma pergunta entre mil.?
4Quem é suficientemente sábio e corajoso,
para lhe resistir e ficar ileso?
5Ele desloca as montanhas, sem ninguém dar por isso,
e destrói-as, quando está irado;
6arranca a terra do seu lugar
e faz estremecer as suas bases9,6 Literalmente: as suas colunas. No Oriente antigo pensava-se que a terra estava assente sobre colunas..
7Dá uma ordem ao Sol e ele não se levanta;
encerra as estrelas com um selo.
8Ele estendeu sozinho a abóbada celeste
e caminha sobre o mar profundo;
9criou as constelações da Ursa, Orion e Plêiades9,9 Tradução provável de termos hebraicos que designam constelações astrais. Ver Jb 38,31 e Am 5,8.
e os esconderijos do vento sul;
10fez maravilhas insondáveis
e prodígios sem conta9,10 Job retoma a afirmação de Elifaz; ver 5,9..
11Ele passa por mim e não o vejo,
passa sem que eu me aperceba disso.
12Se tira alguma coisa, quem lhe pode resistir
e dizer-lhe: “Que estás a fazer?”
13Quando Deus se irrita, não volta atrás;
a seus pés inclinam-se os monstros marinhos9,13 Ver 7,12 e nota..
14Como é que eu lhe poderia responder?
Como arranjaria argumentos para lhe apresentar?
15Mesmo que eu tenha razão, não consigo responder
e tenho de pedir clemência ao meu juiz.
16Mesmo que eu chamasse e ele me respondesse,
não teria a certeza de que ele me tinha escutado9,16 Ou: Mesmo que eu chamasse e ele nada me respondesse, eu teria a certeza de que ele me escuta..
17Mesmo que me espreite do meio da tempestade
e aumente sem motivo as minhas chagas;
18ainda que não me deixe tomar fôlego
e me encha de amargura!
19Em questão de força, ele é o mais forte;
e a tribunal, quem o obriga a apresentar-se?
20Mesmo que eu me declare inocente, ele condena-me
e castiga-me, sem eu ter culpa.
21Mas eu estou inocente
e já não me preocupo comigo mesmo,
já não tenho interesse pela vida!
22Por isso, digo: “Tudo vale o mesmo!”
Deus destrói o inocente como o culpado.
23Se uma desgraça repentina semeia a morte,
ele ri-se do desespero do inocente.
24A terra fica entregue aos maus
e ele fecha os olhos a quem devia julgar.
Se não é ele que o faz, quem é então?
25Os meus dias correm mais rápidos que um atleta,
fogem sem terem experimentado a felicidade;
26desaparecem como barcos de papel,
como águia caindo sobre a presa.
27Se digo a mim mesmo: “Vou esquecer o meu sofrimento;
vou mudar de cara e aprender a sorrir”,
28de novo me angustio perante o sofrimento,
pois sei que não reconheces que sou inocente.
29Se vou ser condenado,
para quê esforçar-me inutilmente?
30Ainda que me esfregasse com sabão
e lavasse as mãos com potassa,
31tu me afundarias na lama
e as minhas roupas ficariam horrivelmente sujas.
32Ele não é um homem, como eu sou,
para eu lhe responder e desafiar a tribunal.
33Oxalá existisse alguém para arbitrar entre os dois
e erguer a mão entre um e outro.
34Se ele deixasse de me bater
e acabasse o terror que me angustia,
35eu falaria sem ter medo,
mesmo que, para ele, eu não tenha razão9,35 Ou: mesmo que eu não me sinta seguro..»
101«Estou farto desta minha vida!
Vou dar largas ao meu queixume,
vou mostrar a amargura que me vai na alma.
2Peço a Deus: Não me condenes;
diz-me o que tens contra mim!
3Parece-te bem oprimires-me e desprezares-me,
quando foste tu que me criaste
e enquanto deixas que os maus realizem os seus planos?
4Será que a tua maneira de ver as coisas
é igual à de qualquer homem?
5Será que não tens mais experiência,
mais anos de vida do que qualquer mortal?
6Por que é que tentas encontrar em mim
qualquer culpa ou pecado?
7Sabes bem que não sou culpado
e, mesmo assim, ninguém me livra da tua mão.
8Tu me criaste e modelaste com as tuas mãos;
e agora voltas-te para me destruir?
9Lembra-te que me formaste com o barro!
Vais transformar-me de novo em pó?
10Tu fizeste o meu corpo,
como quem coalha leite, para fazer queijo10,10 Imagem destinada a expressar o progressivo desenvolvimento do feto no ventre materno..
11Teceste-me de ossos e músculos
e cobriste-me de carne e de pele.
12Deste-me a vida e trataste-me com amor
e os teus cuidados têm-me conservado em vida.
13Mas agora sei que no fundo do teu coração
tinhas uma ideia escondida.
14Se eu pecasse, havias de pedir-me contas
e não passavas sem castigar a minha culpa.
15Se fosse culpado, ai de mim!
Mas se eu fosse inocente,
também não poderia levantar a cabeça,
sempre humilhado e coberto de aflição.
16Se levantasse a cabeça, agarravas-me como um leão
e voltavas a fazer prodígios contra mim.
17Intensificavas o teu furor contra mim
e ficavas ainda mais irado comigo,
tratando-me cada vez com mais dureza.
18Então por que me fizeste nascer?
Podia ter morrido, sem ninguém me chegar a ver.
19Seria como se eu não tivesse existido;
do ventre seria levado ao sepulcro.
20Os meus dias são breves!
Que Deus se afaste e me deixe,
para eu poder sorrir um pouco,
21antes de ter de me ir embora,
sem esperança de voltar,
para a terra da sombra e das trevas,
22terra negra e sombria,
de trevas e confusão,
onde até a luz é escuridão.»